O que é fotografia participativa?
Uma máquina fotográfica nas mãos e muitas ideias na cabeça dos participantes para produzirem imagens sobre as suas vidas, a sua família e a sua comunidade.
Fotografias que servem como ponto de partida para um diálogo crítico sobre os seus direitos e deveres enquanto cidadãos, os seus projetos e histórias de vida, e os desafios que enfrentam no contexto em que vivem.
Na prática, os participantes recebem máquinas fotográficas para documentarem o seu dia a dia. Estas imagens são depois utilizadas para identificar problemas sociais, criar diálogo e promover mudanças na sociedade. Deste modo obtemos uma visão única do mundo de cada indivíduo que o partilha de um modo directo e poderoso, enérgico e pessoal.
O que é a Metodologia photovoice?
É a metodologia central usada nos projetos FOS. Traduz-se na utilização da fotografia como ferramenta base que procura a ação e a mudança social.
Desenvolvida pelas investigadoras Caroline Wang e Mary Ann Burris, photovoice é uma palavra que designa simultaneamente uma metodologia, uma prática e um conceito, definindo-se da seguinte forma:
Processo pelo qual as pessoas podem identificar, representar e reforçar a sua comunidade através de uma técnica fotográfica específica.
Como prática baseada na produção de conhecimento, o processo photovoice tem três objectivos principais:
1- capacitar as pessoas para registar e refletir as forças da sua comunidade e as suas preocupações
2- promover o diálogo crítico e o conhecimento sobre questões importantes através da discussão de fotografias em grande e pequenos grupos
3- alcançar os decisores políticos.
Em que zonas geográficas atuam, só em Lisboa?
Não. A nossa zona geográfica é aquela onde existem pessoas cuja voz precisa de ser ouvida. Por isso trabalhamos à escala global. Os projectos desenvolvidos surgiram em Lisboa porque as pessoas da Associação são daqui e naturalmente as nossas “redes” estão aqui no distrito e foi mais fácil começar desta forma.
Depois as coisas forma acontecendo e, em 2016 já “saímos de Lisboa”. Em 2015 fomos parceiros da FEC (Fé e Cooperação) no projecto “Crianças com Direitos” para a realização de um processo Photovoice na Guiné Bissau e em em Lisboa. Ainda em 2015 fomos convidados pelo IPAV a realizar um workshop na Academia Ubuntu, respectivamente na de Lisboa e na do Porto.
Em 2016 fomos contactados pela Câmara Municipal de Santa Maria da Feira para a realização de um workshop que teve lugar no passado dia 30 de Abril.
E já fizemos candidaturas europeias em consórcio com Itália e Espanha que infelizmente não foram aprovadas. Mas as pontes estão feitas e continuamos a trabalhar em rede e a querer fazer projectos com esses países. E outros, claro!
Qual a vossa equipa de trabalho, como funciona?
Trabalhamos sempre a pares.
Desenhamos o projecto em equipas que podem ser de duas, três ou quatro pessoas, varia. Depende do tipo de projecto, das parcerias envolvidas. Quando vamos para o terreno vamos sempre a pares. Às vezes em trio, já aconteceu. Isto prende-se com a facilitação de processos de fotografia e photovoice, que sendo muito ricos do ponto de vista da partilha de histórias, e logisticamente muito exigentes (muitas fotografias para descarregar visionar e analisar), têm mais sucesso se formos duas pessoas a co-facilitar. O processo é todo ele assente em metodologias não-formais e, tanto quanto possível, participativas. Dinamizar grupos, tirar de cada indivíduo o seu maior potencial, implica estar muito atento não só aos discursos de cada um mas perceber como estes influenciam a dinâmica do grupo e podem condicionar ou espoletar reacções (positivas e negativas) no(s) outro(s). É muito importante estar atento a isto. Daí que em todos os processos somos duas pessoas – co-facilitamos processos. Quando uma está mais “na linha da frente a dinamizar uma actividade” a outra “aparentemente” apoia na logística, mas na verdade, está atenta a estes detalhes e intervém questionando aqui e ali de modo a garantir que nenhuma informação se perca.
Qual é o vosso público alvo e áreas de intervenção?
Dos 6 aos 96!
Quando a FOS surgiu a nossa prioridade era a de começar a facilitar processos de fotografia participativa e experimentar. Houve um lado experimental muito assumido nestes primeiros cinco anos. Daí termos já trabalhado com diversas faixas etárias e públicos alvo distintos. Também porque tínhamos (e ainda temos!) a ambição de, enquanto associação, ter uma “pool” de facilitadores de fotografia participativa cada um especializado no seu público alvo, de acordo com as suas preferências, apetências.
Em média, quanto tempo de duração têm cada projeto?
Pergunta difícil! Os projectos podem durar uma semana ou um ano dois, três…depende como se desenham, de quem solicita este tipo de serviço e o que se quer\pretende com a utilização desta ferramenta.
Por norma um processo tem no mínimo entre 10 a 12 sessões. E desejavelmente uma sessão por semana para que as pessoas tenham tempo para fotografar durante a semana e processar e enquadrar o que foi abordado nas sessões. Ora 12 sessões são 3 meses. Mas por diversas razões já fomos obrigados a fazer projectos intensivos em dez dias ou mesmo uma semana.
Quanto mais extenso for o projecto melhor podemos medir o impacto social do mesmo; já que trabalhamos com questões cuja mudança é lenta e que a maioria das vezes não ocorre de um dia para o outro. Projetos mais longos permitem explorar muito a criatividade o que traz quase sempre mais interioridade, reflexão e profundidade que a medio prazo tem retorno, não só nos processos individuais, como depois se reflete até na dimensão visual do mesmo.
Os projetos são independentes? Em pareceria com outras instituições? Outra?
Os projectos devem ser sempre desenvolvidos em parceria com outras organizações. A fotografia participativa e a metodologia photovoice são em si uma ferramenta de empowerment e por isso devem ser aplicadas num contexto mais amplo de capacitação de indivíduos e suas comunidades. É muito difícil, eu diria até impossível (tivemos essa experiência) fazer um processo num território onde não há pelo menos uma associação de base local (associação de moradores,…) mesmo com o apoio da Junta de freguesia – não chega. É preciso haver mais actores no terreno para que um projecto de fotografia participativa, com ou sem metodologia photovoice, tenha impacto na comunidade.
Qual o papel das empresas e parcerias nesta iniciativa? Qual o seu nível de importância?
No início começamos a desenvolver workshops muito ligados à Responsabilidade Social das Empresas. Estas têm meio dia ou um dia de duração. Em relação às empresas confesso-te que a expectativa era grande já que havia pouca gente a utilizar a fotografia como acção de teambuilding ou mesmo relacionada com o voluntariado. Embora as actividades tenham corrido bem continua a ser um desafio muito grande trabalhar com empresas já que trabalhamos com poucas pessoas de cada vez. No máximo podemos envolver 40 pessoas o que, logo à partida, é menos atractivo para uma empresa comparando com ações que podem envolver 100-200 pessoas. Por isso a presença das empresas é (ainda) pouco expressiva no portfolio da FOS. Trabalhar com empresas é muito distinto de trabalhar com o terceiro sector. A linguagem, os objectivos e o “entendimento do mundo” é distinto o que obriga a uma grande ginástica em termos de criação de discurso, modelação de linguagem, criação, desenvolvimento e prototipagem de produtos, …e a dada altura as coisas foram naturalmente acontecendo mais com outros parceiros sociais e não tanto com as empresas. Cinco anos é quase nada na vida de uma organização, (…) quando se está no terreno a implementar projectos não estamos a fazer prospecção com as empresas, não há tempo … a menos que tenhamos uma equipa grande, que não é o caso. Mas temos vontade de fazer mais workshops com empresas, até porque temos muita coisa em carteira para desenvolver.
Quanto às metodologias utilizadas, porquê a escolha do Photovoice? Utilizam outras metodologias?
A equipa é muito variada e vai mudando. Colaboram connosco mediadores culturais, fotógrafas, psicólogos comunitários, educadores sociais e formadores. Esta é a base da FOS que é muito rica por ser tão eclética. Atrás de pessoas com este ‘background’ existe imenso conhecimento e metodologias de trabalho que só enriquecem os projectos. A fotografia participativa teve diretamente a ver com a fundadora do projeto, a Ana Filipa Flores e o seu percurso pessoal e profissional. Conta que quando descobriu a metodologia photovoice percebeu que podia juntar os dois mundos onde sempre gravitava e fazer o que genuinamente gostava: trabalhar com pessoas, ajudando-as no seu processo de transformação usando a arte (neste caso a fotografia) como ferramenta de capacitação. Partilhou a metodologia com a sua rede de amigos que trabalhavam com comunidades mais vulneráveis e estes de imediato reconheceram na metodologia o enorme potencial de capacitação e mudança. A Fotografia Participativa e a metodologia Photovoice é o ‘core’ do nosso trabalho mas na prática utilizamos muitas metodologias. No início do projeto começamos por dizer exatamente o que fazíamos … temos powerpoints nos arquivos assim:
“O FOS usa na sua acção metodologias visuais e participativas, trabalha de acordo com conceitos oriundos do fotojornalismo e da cooperação internacional, utiliza a fotografia como médium de expressão segundo uma abordagem de empowerment e baseia a sua actuação em pressupostos da educação não-formal.”
Isto é efetivamente o que fazemos mas é muito jargão académico e deixámos cair.
